terça-feira, dezembro 13, 2011

Sem abrigo, sem amor

Numa destas noites frias, demorei mais tempo a adormecer. Na minha cabeça pairava a imagem de três pessoas: o senhor que vi a dormir de sandálias e sem cobertor na Almirante Reis; o senhor que passou por mim na estação de Santa Apolónia com um casaco de tamanho muito inferior ao que precisava e a senhora que está muitas vezes sentada debaixo das arcadas do Museu Militar.

Penso muitas vezes nesta senhora, talvez seja pela frequência com que a vejo, talvez seja pelo facto de ser mulher, ou talvez seja pelo facto de estar quase sempre a sorrir. Causa-me uma estranheza enorme vê-la a sorrir. Não porque ache que ela não deva sorrir, mas porque desconheço o motivo porque sorri.

Enquanto pensava neles, considerava o facto de ter os meus lençóis quentes, a segurança da minha casa e o calor do corpo do meu namorado ao lado. É que talvez o maior problema de ser sem abrigo talvez vá além do não ter abrigo, é mesmo o não ter amor (a propósito disto, gostava muito de ler este livro).

Quando me dizem que Lisboa é linda, eu torço o nariz e abano a cabeça. Como é que uma cidade pode ser linda quando temos tantas pessoas sem abrigo?

Como é que podemos dizer que somos um país evoluído, se nem aquilo que é mais básico conseguimos proporcionar aos outros?

Enfim, haveria muita coisa a dizer sobre isto. Mas não vale a pena estar para aqui a activar os canais lacrimais, que isso não vale de nada.

Vale mais arregaçar as mangas e fazer qualquer coisa. Em primeira instância, podemos dar sacos-cama ou oferecer presentes (são duas acções neste momento divulgadas pela Casa). Eu vou lá esta semana. 
Em segunda instância, e de modo a promover a mudança social e não apenas a remediar, existe o programa Casas Primeiro, que, segundo consta, tem tido uma taxa de sucesso muito satisfatória.

Por acaso estou a publicar isto perto do Natal, mas é só por isso mesmo: por acaso. Um senhor que já foi sem abrigo disse-me que "o Natal é a altura mais hipócrita do ano". Quanto a mim já fico contente se cada vez mais pessoas se preocuparem e quiserem fazer mais qualquer coisa. Se a malta só se lembra no Natal, isso é que já não pode ser.

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